quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

APPLIED WING CHUN EM ABERTO DE ARTES MARCIAIS

Durante dois meses estive preparando um de meus alunos, João Gilberto, que também é especialista e representante do Muay Thai Chaya* no Brasil para lutar em um aberto realizado na cidade de Ilhéus, interior da Bahia, onde este meu aluno é originalmente radicado.


                                          João em treinamento de Chaya na Thailandia
João está se recuperando de uma gastrite bacteriana que o fez perder bastante peso na Thailândia e o impediu de se alistar na Legião Estrangeira em meados deste ano. Contra todos os meus apelos, quis lutar acima da sua categoria de peso. Sem ter condições de treinar bem seu estilo pela falta de parceiros e equipes disponíveis de Thai em Salvador onde vive hoje, ele preferiu fazer a sua preparação treinando metade de seu tempo o Applied Wing Chun comigo, que ganhei por meu turno um parceiro de alto nível técnico para treinar as técnicas de competição que aprendi na China.

João, além de ser meu aluno, é um grande parceiro e amigo. Treinamos, montamos academia juntos, produzimos mais da metade do livro Kung Fu Wing Chun com dinheiro de nosso bolso, e não à toa seu nome é o mais repetido nas dedicatórias da obra. João esteve comigo quando minha filha mais velha esteve doente, quando fundamos a Applied Wing Chun Brasil, na correria atrás de grana para manter o Wing Chun vivo em Salvador, tirando o nome que tínhamos dos pequenos círculos underground do "black-war-skinhead-metal" nos quais a fama da efetividade do nosso Wing Chun começou a ser respeitada, para uma escola onde qualquer um, independente do talento, capacidade física, ideologia ou gosto musical, pudesse aprender nossa arte marcial , desde que respeite e honre nossa visão de mundo, de treino e valores, permanecendo conosco - quando o aluno não se dedica o suficiente convido-o polidamente a procurar um lugar compatível com seu grau de dedicação ao treinamento - com endereço certo depois de peregrinarmos pelo submundo punk, galpões de bairros distantes, casarões abandonados e por fim edifícios de condomínio, sempre com muito orgulho de nosso Wing Chun, até o reconhecimento nacional pelo trabalho que fizemos na internet, e o interno reconhecimento dos membros mais antigos e talentos da família do nosso nível técnico, embora o único do sul que tenha tido humildade, lastro e culhão para falar isso publicamente tenha sido meu Sihing Marcelo Florentino, coisa que lhe serei eternamente grato.


João ganhou a luta, mas não levou. Na minha visão de lutador, ganhou os três rounds com folga, perdendo a chance de nocautear no final. Entretanto, duas quedas com low kicks no último round, além de duas cotoveladas (proibidas naquela competição) dadas pelo hábito tanto do Wing Chun quanto do Thai clássico de transformar um soco bloqueado num golpe de cotovelo, fizeram-no perder pontos preciosos. Mas faltou pouco para que ele nocauteasse seu oponente com um bom boxe, e só a sua postura, sua confiança num estádio cheio de gente torcendo contra, mostra o quanto João já é maduro em seu espírito de lutador. Ele ficou calmo, relaxado, rindo, todo o tempo, e quem já lutou sabe que "quem tem ... tem medo". Ajudou seus amigos ficando no corner quando necessário, tranquilizou seus amigos nervosos antes das lutas, cumprimentou seu adversário na derrota e valorizou a vitória do mesmo, mostrou ser leal, companheiro. Tudo o que eu sempre quis ver num discípulo.


A rotina de treinamento em minha casa, onde fica nosso novo MoGwun, corrida, técnica, sparring, limpeza do local de treino, preparo das refeições, receber os alunos, dar aula junto, aguentar o cansaço e a dor no corpo dessa maratona de 5 horas, especialmente para mim que já não sou nenhum garoto e já sinto um pouco o treino de alto nível, aproximou mestre e discípulo ainda mais, e acho que honramos nossos ancestrais, nosso SiFu Li Hon Ki e os poucos condiscípulos que respeito na familia. Lutamos com honra, contra adversário mais pesado e bem preparado. Do applied wing chun João aplicou em seu jogo as coberturas de pernas treinadas á exaustão, tanto que o chute "rabo do crocodilo" foi usado pelo adversário mais pela dor que as coberturas do Thai Chaya e do Wing Chun causam que por visão de luta. João usou também Din Choi e Kwan Sao Dang Gerk. Pouco, mas foi bom pelo tempo curto que treinamos, e pela falta de hábito de João com o Wing Chun de competição, embora já tenha quebrado muito professor de boxe que nos menosprezou pela de conhecimento da nossa técnica apenas com o Wing Chun clássico de defesa pessoal.

                                                                Lucas Forrest, lutador de Wing Chun, 
                                                                TKD e Luta Livre não lutou, seu adversário 
                                                                se machucou. Foto, treino João e Lucas.


O link para trechos curtos da luta o leitor pode encontrar em: http://www.ogladiador.com

Próximo post comento a vitória de meu ex-parceiro de treino Nelson Santana, ex-campeão brasileiro de Kung Fu preparado por Edy Freire, ambos discípulos de Li Hon Ki, em evento de MMA em Campinas, com um uso mais ostensivo do Wing Chun que na luta de João. Falta o "abutre" mandar-me o vídeo da luta, que fica melhor comentar. Se não me enviar, paciência, comento do jeito que der. Nelson irá começar preparação comigo aqui Salvador e continuará com Dhai Sihing Marcelo Florentino em SP, e tenho boa perspectivas de maior aplicação da técnica, porque Nelson já tem um chão muito bom, isso vai deixá-lo tranquilo para fluir em seu Wing Chun e boxe em pé.

                                                        Nelson treinando no Muk Yam Jong anos atrás

Abraço,
Marcos.

*Chaya é um estilo de Muay Thai de defesa pessoal com estrutura, golpes e proposta marcial muitíssimo parecidos com Wing Chun, ou melhor, desculpem a falha, especificamente com o "Applied" Wing Chun, que usa as extremidades como joelho e cotovelo para machucar o adversário na defesa. Eu não sei outras escolas usam esta abordagem, até hoje nunca vi nada parecido. Agora, se você fala em geração de energia, "encaixe" etc., isso já é bem falado no Brasil, mas isso é já influência forte do livro e das vídeo aulas publicados por SiFu Li Hon Ki nos meados dos anos noventa.



segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Meu desejo, meu pedido e destino na noite estrelada

Hoje não vim para falar de socos ou chutes, ou para tentar explicar pela incontável vez para as pessoas que o Wing Chun não é uma forma idiota de atacar para frente como se se estivesse tendo um ataque epilético com socos de lango-lango.

Quero falar sobre minha filha primogênita, Nathália, ou melhor, sobre sua ausência, a falta que ela me faz. Ontem ela fez cinco anos. Não pude ouvir sua voz, nem vê-la fazer com sua mãozinha a idade fácil. Não sei quais seus sonhos, nem o que ela espera do futuro, nem mesmo deste tão próximo, o que ela quer ganhar de natal, embora desconfie. Sonho com ela todos os dias, sem faltar um só, e são sonhos doloridos que não raro me deixam prostrado e soturno durante o dia. E eu sequer sabia que isso podia acontecer com alguém antes de perder o convívio com ela.

Há mais de nove meses não a vejo. Acabaram-se os banhos, e com eles a promessa não muito segura do shampoo passar longe de seus olhos, o preparo do jantar, o beijo de boa noite, o ouvir de sua vozinha doce pedindo-me para contar a mesmíssima história de novo, e o vídeo batido das princesinhas para fazê-la capitular ao sono. Ela escondida num canto, de costas, com os braços cruzados e a cara emburrada quando eu lhe ralhava. Os passeios solitários e gostosos ao parque, o prazer de fazermos uma refeição juntos num lugar público exibindo nossa harmonia, a filha pequena nos braços fortes do pai babão, e aquele repente do seu olhar silencioso em mim, enquanto seus dedinhos passeavam pelo meu rosto, marcando-me para sempre com sua candura, com o seu amor simples e puro de criança. Aqueles abraços demorados e tão profundos nos reencontros, nas despedidas. Tão pequena e já tão forte, tão serena no lidar com a lonjura.

Às vezes me revolto, tenho desejos amargos e pouco gentis. Mas quando chega a noite, destarte  o sofrimento incomensurável e luta para que o sonho doído não deixe mais uma marca atroz para o dia implacável, sei que fiz a coisa certa, embora as pessoas à minha volta, mesmo as mais próximas, não entendam que um pai sempre sabe o que é melhor para o filho. Apesar de toda crítica, todo o preconceito que existe contra pais em minha situação, que muitas vezes aceitam a critica de tanto a ouvir repetir, ao invés de seguir seu coração. E da mesma maneira que perdi minha filha, sei que a terei de volta em meus braços um dia.

Com quatro anos incompletos, Nathália me disse certa vez: "Papai, eu sempre olho para céu procurando você". E todos os dias, na madrugada, é lá que a encontro, no céu estrelado onde eu me perdia em minha meninice nas noites escuras do interior. E quando olho para céu hoje, homem feito, maduro e ferido, em meu ritual diário, sei de cor meu desejo, meu pedido e meu destino. Boa noite, filha.


Destrinchando o Muk Yam Jong, o boneco de madeira do Wing Chun, em uma análise de caso. Parte II

Pois é, assim como o personagem do game Tekken, Mukujin ( 木人) lit. Pessoa de Madeira, Uma corruptela de seu alter ego, Muk Yan Jong ( 木人...