quinta-feira, 31 de maio de 2012

Comentando o "kickboxing" do Applied Wing Chun

Para chegarmos bem aos mil acessos neste mês, e aproveitando a segunda vinda de meu aluno Dido, bem conhecido no Wing Chun por blogar este tema, a Salvador para treinar Sil Lim Tao, primeiro nível do sistema, vim pisar de vez na cabeça dos nossos (poucos) detratores que, nos últimos meses, assim que saíram nossos primeiros vídeos, começaram a procurar nossos contatos na internet e aconselha-los a não fazer nosso curso de formação de instrutores porque este que vos escreve seria um sujeito sem cultura que, ao invés de ensinar o "tradicional" Wing Chun Kuen Phai ensinaria uma versão porradeira e kickboxeada da luta.

Como eu entendi depois algum tempo que a melhor maneira de combater esta gente pequena é deixar a mesma abrir o bueiro, deixei rolar à vontade, mas graças a Deus me ocorreu aqui de abordar este tema porque as pessoas realmente, por ignorância (no sentido óbvio de desconhecer algo) acabam achando que a gente não faz wing chun, e que é uma heresia usar estas luvas de boxe malditas, e todo este equipamento que nos deixa parecidos com aqueles heróis de seriado japonês. Então, até mesmo para meus diletos amigos que são profissionais de wing chun de outras escolas, vai a explic...ups, comentário, porque quem tem de se explicar é quem deve algo, e não eu. Então em poucas linhas vocês entenderão o porquê de tanto aparato durante o treinamento.

O Wing Chun de nossa família é marcado pela máxima confuciana que diz que "A essência do conhecimento consiste em, uma vez possuído, aplicá-lo". Foi este o enfoque dado por Yip Man a Leung (Duncan) Siu Hung e por este último a seus seguidores. Sendo assim, nossa escola é também conhecida como a escola do "Primeiro Contato". Isso porque como o nossa luta supõe que nosso oponente será mais alto, mais forte, mais rápido ou tem algum tipo de vantagem, numérica ou ainda de meios, sobre nós, devemos então tirar o máximo do que temos para compensar. Neste caso específico, usamos as extremidades mais distais ou rígidas de nossos ossos combinados a movimentos biomecânicos que visam jogar a toda a força de nosso corpo contra o seguimento "mole" do corpo do adversário que está no ataque em curso, fazendo com que o mesmo se machuque a ponto de desistir de continuar a nos agredir e saia da disputa.

Marcelo mostra biomecânica defensiva-ofensiva do Wing Chun na TV

Sendo assim, quando atacados por grandes ataques circulares, usamos por exemplo, o Tan Sao expondo o cotovelo. Num treinamento, ou numa agressão muito forte, o contato do antebraço com a defesa pode, além de gerar grande dor, paralisar o nervo radial e deixar o oponente sem mover alguns dedos por algumas horas.


Wesley usa proteção e luvas durante treino de Pak 


No Pak Sao a grande ardência da pele pela repetição das defesas explosivas exige a presença de um protetor de antebraço, que pode ser substituído pela luva de boxe nos treinos de contato, já a que luva impede que o tapa seja executado com total perfeição e força. Seguindo o mesmo raciocínio, quando usamos nossa perna contra a perna adversária procuramos as articulações e mesmo o pé, pisando a ponta para gerar uma alavanca que "estoure" o tornozelo. Como nem sempre é possível treinar dessa forma sem inutilizar o parceiro por alguns dias, geralmente chutamos na canela, e uma vez na defesa posicionamos o corpo para, novamente, o inimigo enfrentar com sua canelada todo o peso de nosso corpo.

SiBak Falkner se cobre. Seria melhor ter chutado a pilastra.

As pessoas estranham ao nos ver com luvas de boxe. Elas não entendem que nem sempre usamos as luvas para ter um maior contato físico, mas para proteger nossos dedos frágeis do cotovelo que usamos gentilmente contra os jabs. Um de meus alunos treinou com SiFu Paulo Júnior, a quem ajudei recentemente a afiar a técnica, sem ouvir meus apelos de que colocasse uma luva de boxe, ao invés da de freestyle. Paulo é muito bom com esta técnica. O aluno quebrou um dos dedos e ficou dois meses parado.



Johnny Tiger ajuda lutador a fazer kwan sao com olhos bem abertos, molhando-os.


 Dido chuta bem. Foi recrutado a ajudar SiFu.


Não é possível treinar nosso repertório técnico sem proteger-se minimamente. Quando digo que calejamento shaolin ou de Muay Thai não é suficiente para evitar essa dor absurda, as pessoas não acreditam. Mesmo quando fazemos campings usando thai boxers profissionais, eles têm de ficar cobertos de equipamento dos pés a cabeça, porque respeitam nossa especificidade e não a subestimam, pois devem proteger-se, em especial nas técnicas em que reagimos da posição parada, que é nossa especialidade para as situações de combate irrestrito ou "de rua". Se temos recursos, porque não usá-los?





 Depois de um dia inteiro de treino, todos exaustos.
SiFu Marcos e seus discípulos em seu MoGwun


Pessoal, vou ficando por aqui. Treinando à noite o sono vai embora, e já é dia claro de mais treinamento antes que Dido volte ao Recife. Confiram no link abaixo Dido executando Tan Da Lien Wan Choi na manopla, usando os cotovelos para se cobrir de ataque circular. Estou à disposição para esclarecer qualquer dúvida adicional. Quero agradecer por fim todo apoio da comunidade do kung fu e especialmente a do Wing Chun à minha última postagem. Nosso Wing Chun é a nona geração desde seu início. Sabemos de cor o nome e a história de cada mestre que nos precedeu, e o que cada um trouxe de único ao que a arte é hoje, e procuramos honrar este esforço ancestral com o melhor. Entretanto, se não pagamos de monge nos treinos, se não vestimos vestes tradicionais, isso pouco importa, até porque Wing Chun foi um estilo treinado reservadamente até uns 60 anos atrás, de forma que nunca houve uniforme oficial, ou original. Não é se vestindo de punk que você vai ter o underground vivendo em você, só para ficar num exemplo mais visual, não são suas roupas, seu moicano ou seu equipamento, que tornam você diferente, são nossas suas atitudes perante nossos antepassados, nossa família Wing Chun, nossa família filial, nossos amigos e a sociedade. Isso, temos de sobra. Abraço!
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sábado, 5 de maio de 2012

SiFu Marcos participa de treinamento de atleta do TUF Brasil

Há quase um ano atrás eu escrevia aqui neste blog um artigo polêmico já pelo título em que eu anunciava que treinar Chi Sao e Lap Sao não prepara ninguém para uma luta. Como era-me difícil escrever sobre este assuntos para leigos, fiz uma introdução sobre o assunto que gerou discussões acaloradas na internet (vide link do tópico: http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=1268204&tid=5642465628349929732), onde todos logo entenderam erroneamente que eu disse que esta técnica não prestava, ou não era passível de aplicação pratica, e prometi um artigo que serviria de continuação ao primeiro que ficou só na promessa mesmo, em parte por ser algo difícil de escrever, em parte porque isso mexe com aquelas coisas extremamente subjetivas em Wing Chun como estes tais exercícios que mais parecem coisa de filme de kung fu de terceira categoria, e eu não quero ser visto como um destes teóricos que não entendem nada de luta de verdade. Mas agora, como este título no post, certamente todo mundo vai ler e entender o que tenho a dizer, porque agora temos milhões de testemunhas daquilo que queremos mostrar, e os resultados são perfeitamente verificáveis em vídeo.

Confesso que não sou um cara totalmente aficcionado em lutas hoje como era antigamente, quando eu era um lutador em todo o sentido da palavra. Afora algumas lutas do UFC de caras que sou fã e que vejo de vez em quando, se alguém me mostrasse o título deste texto algumas semanas atrás eu provavelmente perguntaria "Quem fez esta proeza?"

Pois bem, eu havia encontrado numa competição de MMA, a qual fui convidado por meu cunhado, um antigo ex-parceiro de treino e colega da faculdade de Educação física chamado Leonardo Chamusca e que hoje é preparador físico de atletas profissionais. Nós treinamos durante aproximadamente um ano os basics do wing chun na mesma academia em que o então vice-campeão mundial de jiu jitsu Rodrigo "Minotauro" Nogueira dava aulas. Léo, como o chamávamos, já era instrutor de Wing Chun e aficionado em MMA, e treinava BJJ sob a orientação de Nogueira, enquanto eu ia tomando minhas primeiras lições particulares com SiFu Li Hon Ki. Desde aquela época Chamusca já tinha idéias extremamente avançadas para época sobre como poderíamos colocar o aquilo que aprendíamos sob uma perspectiva mais prática.

Anos se passaram, e um dia Léo chegou com uma proposta de levar o Wing Chun para o MMA, e que precisava de um especialista no assunto. Logo de cara eu torci o nariz para a idéia, porque geralmente os entusiastas do Wing Chun não o entendem o suficiente para entender que o mesmo não é uma luta de ringue, mas um método de defesa pessoal desenvolvido por monges zen extremamente particular e focado para um objetivo diverso e um público alvo muito diferente de atletas profissionais, embora mestres ainda sustentem que o wing chun é algo mortal demais para ser usado plenamente numa luta. Ouvi este tipo de merda a minha vida inteira.

Foi aí que Léo me surpreendeu. Ele dissera que tinha uma dificuldade (leia-se oportunidade) muito particular com um atleta que era preparado fisicamente por ele, um lutador oriundo do Tae Kwon Do chamado Hugo "Wolverine" Viana que, destarte essas dificuldades, estava a cinco lutas invicto, e que era um forte candidato ao UFC num futuro próximo. Muito antes de Anderson Silva postar uma foto de Yip Man em seu twitter e falar sobre o wing chun que praticara no passado, Leonardo me disse que Anderson pegava a premissa básica da estratégia de luta do Wing Chun, a quebra de ritmo, do "tempo" de luta, e que já a vinha usando com sucesso em suas lutas, e foi desfraldando uma série de informações que eu ouvia com certas reservas.

Quando Léo explicou-me qual era sua intenção, trabalhar determinados problemas que só existem na realidade do MMA na curta distância, neste caso específico, eu que também treinei MMA comecei a pensar com quanta maldade, com quanta crueldade poderíamos dar armas a Hugo porque ele tiraria força bruta de onde normalmente as pessoas não esperam, porque não está baseada na rapidez, na juventude, na velocidade, mas no jeito que você usa o que seu corpo te oferece de acordo com a situação.

Eu fiquei meio sem jeito para trabalhar com aquele rapaz inicialmente, porque ao invés de mostrar a ele como era nossa adaptação de um Wing Chun defensivo a uma luta de ringue - justamente o "kickboxing" que somos acusados de fazer, e que na verdade só tem golpes de kung fu, Léo e eu decidimos começar a trabalhar com ele um exercício tradicional que, como disse no artigo mencionado acima, realmente não prepara ninguém efetivamente para lutar chamado em chinês de Lap Sao (puxar braços) a fim de lhe dar noções de lateralidade, geração de energia na distância curta, uso de cotovelo etc. Ele já era um lutador completo, e ensinar do começo uma nova arte marcial com um jeito totalmente diferente do que ele sabia poderia ser demorado e infrutífero, além de perdermos um tempo precioso.

Hugo tem um perfil diferente da maior parte dos lutadores, ele teve uma educação formal muito boa, é um fisioterapeuta e um cara muito educado, focado e inteligente. Ele aprendeu rapidamente noções básicas de Chi Sao e Lap Sao, e tem uma força descomunal para sua pouca estatura, mas um coisa estava me incomodando, eu projetava ele tentando aplicar as técnicas da mesma maneira que aprendeu (vide artigo sobre lap sao) exatamente como faz a maior parte dos lutadores de nossa arte, e isso poderia ou dar muito certo, apenas pelo desconhecimento de seus adversários da técnica, ou muito mal, ser nocauteado tentando amarrar os braços de um cara escorregadio e preparado.

Então eu disse a ele para não tentar fazer aquilo por fazer, mas entender que o Chi Sao/Lap Sao são ferramentas para o treinamento cerebral, que existe uma lógica naqueles movimentos, e que desde que ele os praticasse com diligência, ele absorveria intuitivamente aquela lógica e que ela iria dizer-lhe o que fazer quando a maior parte das situações não treinadas especificamente aparecessem. Quando vi a primeira luta dele na competição ficou óbvio para mim o uso da técnica, especialmente a noção de grudar e passar o cotovelo de forma extremamente poderosa adaptadas por Léo no dia-a-dia de seu treinamento. É uma satisfação ver nossa arte ser aplicada em combate, e ver como um wing chun genuíno pode ser usado de diferentes formas numa luta, justamente por esta capacidade de adaptação.

O sucesso deste trabalho, aliado a pequenas intervenções de consultoria em outras competições e, graças a Deus, a seriedade que passamos no nosso trabalho e o reconhecimento um pouco tardio de nosso nível técnico abriu outras possibilidades de intercâmbios e parcerias, tanto para nosso treinamento pessoal, que julgo o mais importante, porque vendemos melhor aquilo que vivemos e acreditamos, quanto para vôos mais altos, e espero que isso contribua de alguma forma para o resgaste do respeito por nossa arte marcial. Aguardem novidades.

Abraço,
Marcos.


HOW ELEMENTS OF APPLIED WING CHUN WENT TO TUF - BRAZIL

Almost a year ago I wrote here an article in which I said that practicing only "Chi Sao" and "Lap Sao" doesn't be able anyone to fight better. Many people didn't understand what I wanted to say and they started thinking that I said these traditional exercises don't work in any situations. However, the main of my idea was very simple. These exercises really work but not exactly how people do in the gym. It's very commum to find Wing Chun and Jeet Kune Do practitioners completely alienated with the idea they can tie their opponent arms and hit freely like in a chinese movie. That's not impossible, but whom fights against a prepared opponent knows that is a little bit hard to execute.

So, I promissed to write a continuation of the first article to explain it but I didn't. First of all due to this matter being something very complicated to explain without an image of what you want to show and at last, I was searching for an opportunity of working in a pratical way because in my mind anything out of this way would be just talk and talk again. Less words, I wanted to prove what I had supposed in my text could be showed without giving space to my martial arts friends that don't agree with me in this particular case.

Earlier than I could've thought and in a way that I also couldn't imagine in advance I had a chance to work on it. An old Wing Chun and Physical Education classmate called Leonardo Chamusca now is a coach and personal trainer of professional fighters here in Salvador. Our city receive every year hundreds of fighters come from the whole world to get some especific skills in MMA, especialy  western boxing and BJJ. And we can't forget that was here that Capoeira was born like a tool of liberation of the brazilian black people originated from africans and indians dance, rhythm, culture and honoring values, so specially during the summer right before the Carnival you can see european people turning our Capoeira rounds more coloured and beautiful and conected worldwide.

Therefore, when we met again after years during a MMA competition and he said that he had ideas to work togather I thought something relationated with physiology of the exercise, gym, everything but never, ever, something that concerned to our previous Wing Chun experience. Leonardo had been a formal “Minotauro” Nogueira’s BJJ student, and had contact with guys like the famous MMA boxing coach Luis Dorea and many others champions. Despite Leonardo's recent history in MMA, he also had been a formal wing chun instructor and I remebered he had great and clever ideas to give our ancient training more eficiency.

Our Master Hon Ki Li (Li Hon Ki) was a great fighter during the early 70's but he is a very tradiciotional man in his way to teach wing chun and if we wanted to become fighters like he was, we would have to go to another martial arts studios, championships and sometimes fight on the street to see how it worked. However, we were young, and after years I finally could understand what is the tecnical purpose of the Wing Chun among another martial arts and I don’t need to prove that our style is better or worse to any other style anymore. Just to show how it works avoiding criticise without knowledge. This is the best speech.

Leonardo had come to my house and started exposing his ideas. At the beginning I thought it wouldn't work. Many months before Anderson Silva had posted Yip Man's pictures on his twitter and talked in a brazilian TV channel about his experience with Wing Chun years ago, Chamusca told that he was using it mixed with the tecniques and hints he learned from Steven Seagal and I heard that a little bit skeptical. Although all my reluctance, when he gave a proper situation to work on using a specific wing chun tool, I had just seen that our vision of how to use wing chun in combat had perfect fit.

His athlete, Hugo "Wolverine" Viana (Team Belfort at TUF Brazil) according to his description, was a very good striker, specially using his legs due to his preceding Tae Kwon Do career. But he had some especific troubles in some situations in fighting short distance. When Leonardo showed me the mainly positions, and how many chances of hiting really hard his opponents Hugo had lost, a new world full of opportunities immediately opened up in my mind. Our Applied Wing Chun, basead in create explosive strength using biomechanical tricks could be used to hit short distance in a way that an opponent can't imagine before getting hurt.

Instead of show him our tipical manner of fight against professional fighters, we decided to teach him the traditional Wing Chun Lap Sao (in some branches also called Bong Lap Da etc.) exercises and Tang Chi Sao.A very inteligent guy, humble and very strong for his short stature, he could learn very fast and  - most important - to understand what I wanted to say when I asked him for don't try to apply those exercises literally, but to feel the logical way to use the elbows to stop, to cover, follow up and hit like water that destroys everything using a smooth force of adaptation. The most important thing would be repeat and repeat those exercises once again according their original purpose at the beginning.

Changing slightly the orginal exercise following my instructions some time after that, Leonardo could coach his athlete to use that as in the specific situations we had in the beggining as for another ones that appeared later. "It was a truly revolution" Chamusca said me by phone some months later.

When I had seen Hugo's first fight over the internet http://www.ufc.com/tuf-brasil-episode-1 it was clear what Leonardo meant. Despite we always work to see results, seeing them so evidently made me proud. As Wing Chun fighter, I'm happy and thinking in continue this work. You work hard during years for everything "suddenly" start working. Another incredible chance to prove our value appear now. However, like this time, we'll work and wait for the results  and just after that we are going to show that here.

Hug,
Marcos.

Destrinchando o Muk Yam Jong, o boneco de madeira do Wing Chun, em uma análise de caso. Parte II

Pois é, assim como o personagem do game Tekken, Mukujin ( 木人) lit. Pessoa de Madeira, Uma corruptela de seu alter ego, Muk Yan Jong ( 木人...