sábado, 5 de maio de 2012

SiFu Marcos participa de treinamento de atleta do TUF Brasil

Há quase um ano atrás eu escrevia aqui neste blog um artigo polêmico já pelo título em que eu anunciava que treinar Chi Sao e Lap Sao não prepara ninguém para uma luta. Como era-me difícil escrever sobre este assuntos para leigos, fiz uma introdução sobre o assunto que gerou discussões acaloradas na internet (vide link do tópico: http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=1268204&tid=5642465628349929732), onde todos logo entenderam erroneamente que eu disse que esta técnica não prestava, ou não era passível de aplicação pratica, e prometi um artigo que serviria de continuação ao primeiro que ficou só na promessa mesmo, em parte por ser algo difícil de escrever, em parte porque isso mexe com aquelas coisas extremamente subjetivas em Wing Chun como estes tais exercícios que mais parecem coisa de filme de kung fu de terceira categoria, e eu não quero ser visto como um destes teóricos que não entendem nada de luta de verdade. Mas agora, como este título no post, certamente todo mundo vai ler e entender o que tenho a dizer, porque agora temos milhões de testemunhas daquilo que queremos mostrar, e os resultados são perfeitamente verificáveis em vídeo.

Confesso que não sou um cara totalmente aficcionado em lutas hoje como era antigamente, quando eu era um lutador em todo o sentido da palavra. Afora algumas lutas do UFC de caras que sou fã e que vejo de vez em quando, se alguém me mostrasse o título deste texto algumas semanas atrás eu provavelmente perguntaria "Quem fez esta proeza?"

Pois bem, eu havia encontrado numa competição de MMA, a qual fui convidado por meu cunhado, um antigo ex-parceiro de treino e colega da faculdade de Educação física chamado Leonardo Chamusca e que hoje é preparador físico de atletas profissionais. Nós treinamos durante aproximadamente um ano os basics do wing chun na mesma academia em que o então vice-campeão mundial de jiu jitsu Rodrigo "Minotauro" Nogueira dava aulas. Léo, como o chamávamos, já era instrutor de Wing Chun e aficionado em MMA, e treinava BJJ sob a orientação de Nogueira, enquanto eu ia tomando minhas primeiras lições particulares com SiFu Li Hon Ki. Desde aquela época Chamusca já tinha idéias extremamente avançadas para época sobre como poderíamos colocar o aquilo que aprendíamos sob uma perspectiva mais prática.

Anos se passaram, e um dia Léo chegou com uma proposta de levar o Wing Chun para o MMA, e que precisava de um especialista no assunto. Logo de cara eu torci o nariz para a idéia, porque geralmente os entusiastas do Wing Chun não o entendem o suficiente para entender que o mesmo não é uma luta de ringue, mas um método de defesa pessoal desenvolvido por monges zen extremamente particular e focado para um objetivo diverso e um público alvo muito diferente de atletas profissionais, embora mestres ainda sustentem que o wing chun é algo mortal demais para ser usado plenamente numa luta. Ouvi este tipo de merda a minha vida inteira.

Foi aí que Léo me surpreendeu. Ele dissera que tinha uma dificuldade (leia-se oportunidade) muito particular com um atleta que era preparado fisicamente por ele, um lutador oriundo do Tae Kwon Do chamado Hugo "Wolverine" Viana que, destarte essas dificuldades, estava a cinco lutas invicto, e que era um forte candidato ao UFC num futuro próximo. Muito antes de Anderson Silva postar uma foto de Yip Man em seu twitter e falar sobre o wing chun que praticara no passado, Leonardo me disse que Anderson pegava a premissa básica da estratégia de luta do Wing Chun, a quebra de ritmo, do "tempo" de luta, e que já a vinha usando com sucesso em suas lutas, e foi desfraldando uma série de informações que eu ouvia com certas reservas.

Quando Léo explicou-me qual era sua intenção, trabalhar determinados problemas que só existem na realidade do MMA na curta distância, neste caso específico, eu que também treinei MMA comecei a pensar com quanta maldade, com quanta crueldade poderíamos dar armas a Hugo porque ele tiraria força bruta de onde normalmente as pessoas não esperam, porque não está baseada na rapidez, na juventude, na velocidade, mas no jeito que você usa o que seu corpo te oferece de acordo com a situação.

Eu fiquei meio sem jeito para trabalhar com aquele rapaz inicialmente, porque ao invés de mostrar a ele como era nossa adaptação de um Wing Chun defensivo a uma luta de ringue - justamente o "kickboxing" que somos acusados de fazer, e que na verdade só tem golpes de kung fu, Léo e eu decidimos começar a trabalhar com ele um exercício tradicional que, como disse no artigo mencionado acima, realmente não prepara ninguém efetivamente para lutar chamado em chinês de Lap Sao (puxar braços) a fim de lhe dar noções de lateralidade, geração de energia na distância curta, uso de cotovelo etc. Ele já era um lutador completo, e ensinar do começo uma nova arte marcial com um jeito totalmente diferente do que ele sabia poderia ser demorado e infrutífero, além de perdermos um tempo precioso.

Hugo tem um perfil diferente da maior parte dos lutadores, ele teve uma educação formal muito boa, é um fisioterapeuta e um cara muito educado, focado e inteligente. Ele aprendeu rapidamente noções básicas de Chi Sao e Lap Sao, e tem uma força descomunal para sua pouca estatura, mas um coisa estava me incomodando, eu projetava ele tentando aplicar as técnicas da mesma maneira que aprendeu (vide artigo sobre lap sao) exatamente como faz a maior parte dos lutadores de nossa arte, e isso poderia ou dar muito certo, apenas pelo desconhecimento de seus adversários da técnica, ou muito mal, ser nocauteado tentando amarrar os braços de um cara escorregadio e preparado.

Então eu disse a ele para não tentar fazer aquilo por fazer, mas entender que o Chi Sao/Lap Sao são ferramentas para o treinamento cerebral, que existe uma lógica naqueles movimentos, e que desde que ele os praticasse com diligência, ele absorveria intuitivamente aquela lógica e que ela iria dizer-lhe o que fazer quando a maior parte das situações não treinadas especificamente aparecessem. Quando vi a primeira luta dele na competição ficou óbvio para mim o uso da técnica, especialmente a noção de grudar e passar o cotovelo de forma extremamente poderosa adaptadas por Léo no dia-a-dia de seu treinamento. É uma satisfação ver nossa arte ser aplicada em combate, e ver como um wing chun genuíno pode ser usado de diferentes formas numa luta, justamente por esta capacidade de adaptação.

O sucesso deste trabalho, aliado a pequenas intervenções de consultoria em outras competições e, graças a Deus, a seriedade que passamos no nosso trabalho e o reconhecimento um pouco tardio de nosso nível técnico abriu outras possibilidades de intercâmbios e parcerias, tanto para nosso treinamento pessoal, que julgo o mais importante, porque vendemos melhor aquilo que vivemos e acreditamos, quanto para vôos mais altos, e espero que isso contribua de alguma forma para o resgaste do respeito por nossa arte marcial. Aguardem novidades.

Abraço,
Marcos.


HOW ELEMENTS OF APPLIED WING CHUN WENT TO TUF - BRAZIL

Almost a year ago I wrote here an article in which I said that practicing only "Chi Sao" and "Lap Sao" doesn't be able anyone to fight better. Many people didn't understand what I wanted to say and they started thinking that I said these traditional exercises don't work in any situations. However, the main of my idea was very simple. These exercises really work but not exactly how people do in the gym. It's very commum to find Wing Chun and Jeet Kune Do practitioners completely alienated with the idea they can tie their opponent arms and hit freely like in a chinese movie. That's not impossible, but whom fights against a prepared opponent knows that is a little bit hard to execute.

So, I promissed to write a continuation of the first article to explain it but I didn't. First of all due to this matter being something very complicated to explain without an image of what you want to show and at last, I was searching for an opportunity of working in a pratical way because in my mind anything out of this way would be just talk and talk again. Less words, I wanted to prove what I had supposed in my text could be showed without giving space to my martial arts friends that don't agree with me in this particular case.

Earlier than I could've thought and in a way that I also couldn't imagine in advance I had a chance to work on it. An old Wing Chun and Physical Education classmate called Leonardo Chamusca now is a coach and personal trainer of professional fighters here in Salvador. Our city receive every year hundreds of fighters come from the whole world to get some especific skills in MMA, especialy  western boxing and BJJ. And we can't forget that was here that Capoeira was born like a tool of liberation of the brazilian black people originated from africans and indians dance, rhythm, culture and honoring values, so specially during the summer right before the Carnival you can see european people turning our Capoeira rounds more coloured and beautiful and conected worldwide.

Therefore, when we met again after years during a MMA competition and he said that he had ideas to work togather I thought something relationated with physiology of the exercise, gym, everything but never, ever, something that concerned to our previous Wing Chun experience. Leonardo had been a formal “Minotauro” Nogueira’s BJJ student, and had contact with guys like the famous MMA boxing coach Luis Dorea and many others champions. Despite Leonardo's recent history in MMA, he also had been a formal wing chun instructor and I remebered he had great and clever ideas to give our ancient training more eficiency.

Our Master Hon Ki Li (Li Hon Ki) was a great fighter during the early 70's but he is a very tradiciotional man in his way to teach wing chun and if we wanted to become fighters like he was, we would have to go to another martial arts studios, championships and sometimes fight on the street to see how it worked. However, we were young, and after years I finally could understand what is the tecnical purpose of the Wing Chun among another martial arts and I don’t need to prove that our style is better or worse to any other style anymore. Just to show how it works avoiding criticise without knowledge. This is the best speech.

Leonardo had come to my house and started exposing his ideas. At the beginning I thought it wouldn't work. Many months before Anderson Silva had posted Yip Man's pictures on his twitter and talked in a brazilian TV channel about his experience with Wing Chun years ago, Chamusca told that he was using it mixed with the tecniques and hints he learned from Steven Seagal and I heard that a little bit skeptical. Although all my reluctance, when he gave a proper situation to work on using a specific wing chun tool, I had just seen that our vision of how to use wing chun in combat had perfect fit.

His athlete, Hugo "Wolverine" Viana (Team Belfort at TUF Brazil) according to his description, was a very good striker, specially using his legs due to his preceding Tae Kwon Do career. But he had some especific troubles in some situations in fighting short distance. When Leonardo showed me the mainly positions, and how many chances of hiting really hard his opponents Hugo had lost, a new world full of opportunities immediately opened up in my mind. Our Applied Wing Chun, basead in create explosive strength using biomechanical tricks could be used to hit short distance in a way that an opponent can't imagine before getting hurt.

Instead of show him our tipical manner of fight against professional fighters, we decided to teach him the traditional Wing Chun Lap Sao (in some branches also called Bong Lap Da etc.) exercises and Tang Chi Sao.A very inteligent guy, humble and very strong for his short stature, he could learn very fast and  - most important - to understand what I wanted to say when I asked him for don't try to apply those exercises literally, but to feel the logical way to use the elbows to stop, to cover, follow up and hit like water that destroys everything using a smooth force of adaptation. The most important thing would be repeat and repeat those exercises once again according their original purpose at the beginning.

Changing slightly the orginal exercise following my instructions some time after that, Leonardo could coach his athlete to use that as in the specific situations we had in the beggining as for another ones that appeared later. "It was a truly revolution" Chamusca said me by phone some months later.

When I had seen Hugo's first fight over the internet http://www.ufc.com/tuf-brasil-episode-1 it was clear what Leonardo meant. Despite we always work to see results, seeing them so evidently made me proud. As Wing Chun fighter, I'm happy and thinking in continue this work. You work hard during years for everything "suddenly" start working. Another incredible chance to prove our value appear now. However, like this time, we'll work and wait for the results  and just after that we are going to show that here.

Hug,
Marcos.

7 comentários:

Sifu Juarez disse...

Ótimo artigo meu amigo, achei interessante fazer referência ao link comentando minha postagem abordando o tema de forma superficial, só é uma pena que não pude ter sua opinião postada ali para conversarmos sobre, mas entendo claramente seus motivos. Parabéns por mostrar o wing chun em ambiente desportivo tambem, o que não me apaixona nem motiva mais, forte abraço e muito sucesso, sempre!

Unknown disse...

Caríssimo SiFu Juarez!

Este era o único link que eu lembrava de mais específico dentre a enxurrada de críticas que se seguiram ao meu trabalho e ao Applied Wing Chun que, no Brasil, funciona com escolas - na prática, não no papel - com diferentes abordagens e níveis técnicos, o que é algo preocupante.

De fato, seu comentário lá, embora fosse um contraponto ao meu ponto de vista, foi extremamente polido. Mas eu me referia na crítica ao fake "desiludido" que, não sei se intencionalmente ou não, distorceu um pouco a idéia original que tentei passar. Eu não polemizo gratuitamente, chamo a atenção para coisas que julgo importantes e convido as pessoas a pensar comigo.

Bem, você sabe o quanto coloquei de energia minha naquela comunidade como "ancient", e o quanto ela, infelizmente, se perdeu, mas felizmente o orkut agora cedeu espaço a outras ferramentas como o facebook, e as pessoas podem ter acesso a outras pessoas que realmente têm a formação completa na arte, e que tem opiniões divergentes da unanimidade.

No que diz respeito à competição, acho que é a assim que a natureza funciona, então devemos usar as competições para melhorar, embora obviamente nossa luta tenha propósitos e especificidade para outro tipo de situação em um combate. Mas cultivar o orgulho é bom, e resultado só aparece com quem é competente. O resto é papo-furado.

Forte abraço do seu sempre irmão-wing chun Marcos.

Unknown disse...

Poxa, fiquei muito surpreso, quando comecei a treinar em 2000, meu Sifu, me revelava a mesma coisa que o wing chun é arte marcial mortal, em meu ponto de vista apesar do pouco tempo de treino, e por muitas vezes também parar de treinar por conta de trabalho e estudos, continuo acreditando na teoria de ser mortal o wing chun, porém, essas palavras poderiam ser mudadas, pois toda arte marcial é mortal, o que vai depender disso é o praticante!

Unknown disse...

Parabéns Sifu Marcos!

Sucesso...

Sifu Marcos. disse...

Obrigado, Ramos,

Eu estive durante anos escrevendo contra a ideia defendida pela maior parte dos praticantes e mestres de Wing Chun que o motivo pelo qual nosso estilo não vai bem nas competições é porque a luta seria tão mortal que simplesmente só seria passível de aplicação numa luta completamente sem regras. É muito mais fácil esconder-se comodamente atrás deste raciocínio e deixar de pensar (e, obviamente, lutar, porque quem luta não acredita em bobagem)do entender as razões técnicas do wing chun ser do jeito que é.

Ora, os treinamentos de wing chun na maior parte das escolas é tão sem contato físico, tão pueril que este tipo de raciocínio soa para mim como um insulto à inteligência da pessoas e, principalmente, dos próprios praticantes.

O Wing Chun é tão mortal quanto qualquer outra luta com objetivos técnicos semelhantes.

Obrigado pelo comentário.
Abraço,
Marcos.

Mogg Mester disse...

Sifu Marcos:
Ao apontar aspectos específicos do Wing chun, assim como práticas rotineiras e de grande importância você está criando não apenas uma escola de artes marciais no sentido de apenas luta. Pelo contrário, está criando pensadores que refletem suas ações em combate e sobre o que fazer nesse momento.
Grande matéria. ainda insisto na idéia de colocar seu livro para frente.
Grande abraço

Unknown disse...

Lucas,

Obrigado pelo comentário. Você está diariamente na minha escola, e também nos momentos fora dela, e sabe quem eu sou e qual a relação que tenho com o wing chun e o peso que ele tem na minha vida, em todos os sentidos.

Gostei do que escreveu, pois isto nos mostra que ser um pensador também tem a ver com algo dinâmico, vivo, e lembra a todos que sobretudo no wing chun isso tem que ver com a luta em si. Destarte todo seu potencial como ferramenta de desenvolvimento humano, o Wing Chun é antes de tudo uma arte de combate.

Quanto ao livro, vamos que vamos, nas etapas de produção e vamos mais uma vez dizer algo que ninguém disse, vamos fazer vanguarda de novo. Então, enquanto nossos críticos se concentram fofoca, na postura dúbia, e por isso mesmo na falta total da mesma, a gente vai dizer as coisas que serão tendência para o treinamento no Brasil nos próximos anos. Eu quero fazer a diferença, não estou nessa vida de turista, não. Quero também que tão logo seu livro seja publicado que também o divulguemos aqui. E informar também que o livro de SiHing Florentino "O Que Significa Ser Mestre em Wing Chun" já está disponível para download na comunidade face Wing Chun - Brasil.

Abraço,
SiFu.

Destrinchando o Muk Yam Jong, o boneco de madeira do Wing Chun, em uma análise de caso. Parte II

Pois é, assim como o personagem do game Tekken, Mukujin ( 木人) lit. Pessoa de Madeira, Uma corruptela de seu alter ego, Muk Yan Jong ( 木人...